domingo, 25 de setembro de 2011

Triângulo Aritmético

Triângulo aritmético:
Um triângulo com múltiplas personalidades.

quadro_negro_triângulo_pascal

Obs. Fragmentos retirados do site:  http://matematica-na-veia.blogspot.com/2010/01/historia-do-triangulo-aritmetico-parte.html

Para os apaixonados pela matemática, e até para quem não vê a matemática com bons olhos é um prato cheio, pois esta história é ligada a temas muito interessantes, que certamente irão envolvê-lo.
Você conhece bem o Triângulo Aritmético? Talvez você não conheça nenhum triângulo com este nome, mas em compensação, já tenha trabalhado com o “Triângulo de Pascal”, ou talvez conheça um pouco do “Triângulo Combinatório”, do “Triângulo de Tartaglia” ou até mesmo do “Triângulo de Yang-Hui". Ficou confuso? Na verdade, todos estes nomes citados anteriormente, se referem ao mesmo triângulo, estudado e aperfeiçoado através dos séculos, por vários matemáticos, ou melhor, foram estudadas as mesmas propriedades matemáticas, variando de acordo com o matemático, origem e época.
Veja que, além das obras atuais, existem referências ao Triângulo Aritmético e suas propriedades, que podem ser encontradas rudimentarmente em obras antigas escritas por matemáticos indianos e chineses. Também encontramos alguns indícios superficiais destas propriedades em algumas obras hebraicas, escritas em épocas anteriores a Jesus Cristo. Esta constatação significa que nosso personagem principal é bastante antigo. Podemos citar entre estas obras, a de Pingala (piṅgalá), um antigo matemático indiano, famoso por um dos seus trabalhos, o Chandas shastra (chandaḥ-śāstra, ou Chandas sutra chandaḥ-sūtra), provavelmente, um tratado sânscrito sobre prosódia, (do grego προσωδία), que é considerado parte do Vedanga, ou seja, os “órgãos dos Vedas”.
Pingala viveu em aproximadamente 200 aC., ou seja, mais ou menos 1800 anos antes do matemático Blaise Pascal. (Clermont-Ferrand, 19 de Junho de 1623 - Paris, 19 de Agosto de 1662). Observe que este é um dos primeiros indícios de que não foi Blaise Pascal o autor do triângulo que leva seu nome. Já vimos que o triângulo aritmético é bastante antigo, e você também verá que podemos considerar o triângulo estudado por Pingala praticamente o mesmo encontrado nos livros didáticos atuais do Brasil, ou seja, é idêntico ao Triângulo de Pascal.
Aliás, sabemos que tudo que está relacionado à matemática exige muito estudo, e um processo cansativo de investigação que pode levar séculos. Este processo envolve não um, mas vários matemáticos, tornando desta forma, o trabalho dos historiadores uma tarefa difícil, cansativa, mas ao mesmo tempo bastante recompensadora, principalmente quando se trata de especificar a verdadeira autoria de uma grande descoberta matemática, como é o caso do nosso principal personagem, o Triângulo Aritmético.
No entanto, veremos posteriormente que Pingala também não foi o primeiro a estudar as propriedades relacionadas ao Triângulo Aritmético, pois mesmo antes dele, já existiam antigas obras com algumas regras (Sutras) para o cálculo de combinatória e arranjos.
Pingala apresenta em sua obra, a primeira descrição conhecida de um sistema numérico binário. O envolvimento de Pingala com o triângulo aritmético foi conseqüência dos seus estudos sobre as versificação das métricas musicais. Na verdade, ele observou que as expansões sucessivas das métricas musicais, de uma, duas, três, ou várias sílabas podiam ser dispostas sob a forma de um padrão numérico triangular que corresponde ao triângulo aritmético, o qual denominou Meru-prastara, em homenagem ao sagrado Monte Meru na Índia.
Para ficar mais claro a passagem anterior, observemos um exemplo numérico:
Para calcular as combinações das três sílabas ba, be, bi, Pingala observava  a quarta linha do Meru-prastara que é composta pelos seguintes valores:
1 3 3 1, e então concluía:
3 combinações de uma sílaba: {ba, be, bi}
3 combinações de duas sílabas: {babe, babi, bebi}
1 combinação de três sílabas: {babebi}
Para construir o Meru-prastara, Pingala descreve a seguinte regra:
"Desenhe um quadrado; abaixo dele desenho dois outros, de modo que se juntem no ponto médio da base dele; ou seja, no meio da base, abaixo desses dois, desenhe três e assim sucessivamente. A seguir, escreva “um” no primeiro quadrado e também nos quadrados da segunda linha. Na terceira linha escreva “um” nos quadrados dos extremos, e no meio escreva a soma dos números acima dele.
Prossiga fazendo o mesmo nas outras linhas. Nessas linhas, a segunda dá as combinações com uma sílaba; a terceira dá as combinações com duas sílabas e assim por diante."
O procedimento desta regra pode ser visto na imagem abaixo:
triângulo_pascal_meru-prastara_pingala
Já sabemos que existem diversas formas de representar o Triângulo Aritmético, mas uma das mais produtiva, é quando os valores são deslocados para o lado, ficando na forma de um Triângulo Retângulo.
Através desta representação as sequências dos números naturais, triangulares, etc., são mais visíveis. 
Desta forma podemos visualizar a sequência dos números naturais na segunda coluna, triangulares na terceira, e assim por diante.

  tabela_triângulo_pascal_retângulo
Figura 2: Detalhes do Triângulo Aritmético


Na imagem abaixo você pode observar as sequências dos números naturais, triangulares, e outras:

 triângulo_aritmético_numero_fibonacci_soma_diagonal
Figura 3: Triângulo destacando os números de Fibonacci.

Veja também, que podemos encontrar os números de Fibonacci no Triângulo Aritmético.
Observe as diagonais do triângulo acima onde encontramos os seguintes valores:
 {0, 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34,...}.
Não serão tratados detalhes sobre os números de Fibonacci, mas caso você fique interessado pelo tema, acesse o endereço Números de Fibonacci
É fácil ver que as somas das diagonais realmente são os números de Fibonacci.

 soma_números_fibonacci_triângulo_tartaglia 
Figura 4:Triângulo destacando as somas das sequências.

Na diagonal verde a soma é 5;
Na diagonal azul a soma é 8;
Na diagonal vermelha a soma é 13.

Séculos depois da morte do matemático Pingala, encontramos nainda na obra "Mtasañjīvanī" do matemático Halayudha, o Meru-prastara e a regra de Pingala. Ele ainda descreveu o sistema numérico binário em conexão à listagem das métricas védicas com sílabas longas e curtas.
O Meru-prastara pode ser considerado como sendo o mesmo que a Matriz Triangular conhecida na Europa como Triângulo de Pascal. Este triângulo apareceu pela vez na Europa no título da página da obra “média aritmética” do humanista e matemático Petrus Apianus, e posteriormente, nas obras de Michael Stifel, também na obra “De Numeris et Diversis Rationibus”  (1545) de Johann Scheubel (1494-1570), Tartaglia , BNombelli e outros matemáticos célebres da Renascença, e na obra póstuma de Blaise Pascal  “Traite Dv Triangle Arithmetiqve” de 1654. (veremos mais detalhes posteriormente).
Obra de Blaise Pascal: Tratado do Triângulo Aritmético
Figura 5 :“ Traite Dv Triangle Arithmetiqve” ,Blaise Pascal.
A investigação de Pingala a respeito das combinações das métricas corresponde ao Teorema Binomial. Também é importante citar uma passagem que se refere ao número de combinações de letras, encontrada no primeiro livro cabalístico que se tem notícia, o “Sefer Yetzirá”, escrito por Abrahão (ou Abraão), após receber os conhecimentos da tradição cabalística diretamente de Melquisedeque
A passagem diz o seguinte:
"Aleph com todas e todas com Aleph.
Beth com todas e todas com Beth.
Repetem-se num circulo e existem em 231 portas."
O significado é o seguinte: O alfabeto hebraico é constituído por 22 letras, sendo a primeira, Aleph, e a última Beth, e está se tentando determinar quantos grupos de duas letras podem ser formados com elas. Este número é 231. Genericamente podemos enunciar este problema como uma combinação simples, tema este que já foi abordado aqui no blog “Matemática Na Veia”.
alfabeto_hebreu_idioma

Figura 6: ALEPH BEIT IVRI. Alfabeto Hebreu primitivo com as 22 letras da Cabala.
Observação: No hebraico as letras também são números, isto significa que o estudo da Cabala também requer estudos de alta matemática.
No idioma hebraico há três letras-mães, que são Aleph, Mem e Schin. Há sete letras duplas, que são Beth, Ghimel, Daleth, Chaph, Phe, Resch e Thau. E há doze letras simples ou elementares , que são He, Vo, Zain, Cheath, Teth, Iod, Lamed, Nun, Samech, Ayin, Tsade e Cuph.
O “Sefer Yetzirá” é altamente profundo e, apesar de ser relativamente pequeno, (aproximadamente duas páginas) foi comentado pelo Rabi Shimon Bar Yoshay (possivelmente no século I d.C.), comentários que deram origem ao livro cabalístico mais festejado de todos os tempos, o Sefer Zohar (Livro do Esplendor), o qual contém 24 volumes com aproximadamente 300 páginas cada.
Além destas obras, também encontramos literatura importante sobre o Triângulo Aritmético nas obras chinesas. Bom! Por enquanto vamos ficar por aqui, mas na segunda parte desta história veremos algumas obras importantes dos matemáticos da China e outros paises, que também contribuiram para o desenvolvimento do Triângulo Aritmético.

O Triângulo Aritmético na China
Na China, o Manual de Matemática de Jia Xian, escrito por volta do ano 1050, também trata de alguns conceitos relacionados ao triângulo aritmético.
Mas, o mais famoso matemático chinês associado ao triângulo aritmético é Yang-Hui, o qual estudou as propriedades di triângulo por volta de (1250 d.C). Ele escreveu cerca de dez livros, sendo que em pelo menos dois desses, “Alfa e ômega de uma seleção de aplicações de métodos aritméticos” e uma análise detalhada dos métodos do livro “Nove capítulos” ele estuda e aplica conceitos do Triângulo Aritmético
Entre 1280 e 1320 d. C., viveu o último e maior matemático chinês da idade de ouro, Chu Shih-Chieh (Zhu Shijie – Em chinês tradicional: 朱世傑), que durante vinte anos lecionou por várias regiões da China. Em 1303, escreveu um importante tratado matemático intitulado “Ssu-yüan yü-chien(四元玉鉴), ou “Precioso espelho dos Quatro Elementos. Esta obra marcou o ápice no desenvolvimento da álgebra chinesa.
Ele usou uma extensão do método das matrizes para trabalhar com polinômios com até quatro incógnitas. Também obteve resultados promissores sobre somas de séries.
Páginas do livro:
“Precioso espelho dos Quatro Elementos”

Figura 1: “Precioso espelho dos Quatro Elementos” (1303)
Figura 2: “Precioso espelho dos Quatro Elementos” (1303)
Os quatro elementos, denominados: céu, terra, homem e matéria, representavam as quatro quantidades (incógnitas) desconhecidas em suas equações algébricas. Este livro traz figuras triangulares com até nove linhas. Chu não atribui a si o mérito da descoberta e refere-se ao triângulo como o “diagrama do velho método para achar potências oitavas ou menores”.
Neste livro, é apresentado um método de transformação denominado método fan-fan, que em 1819, o matemático inglês William George Horner anunciaria como sendo uma contribuição sua; o que de acordo com os registros chineses não corresponde à verdade. No entanto, em todo o mundo matemático, tal método é reconhecido como “método de Horner”.
A denominação chinesa mais comum para o Triângulo Aritmético é “Triângulo de Yang-Hui”.


Figura 3: Triângulo de Yang Hui
O triângulo foi ilustrado pelo próprio matemático Yang Hui, (chinês tradicional: 楊輝; chinês simplificado: 杨辉; 1238-1298) em sua obra “Xiangjie Jiuzhang Suanfa (详解九章算法) embora também tenha sido usado por Jia Xian em aproximadamente 1100.
Triângulo de Jia Xian
            
Figura 4: Triângulo de Jia Xian
Os Árabes
A reconstituição do envolvimento dos matemáticos de religião islâmica com o Triângulo Aritmético é bastante difícil, pois, sabemos que a maioria dos principais documentos associados ao triângulo perdeu-se no tempo. Contudo é razoável afirmar que muitos dos matemáticos islamitas aprenderam sobre as propriedades do Triângulo Aritmético através das compilações escritas no idioma árabe, que foram transcritas em livros indianos, como é o caso do, “Princípios do Cálculo Hindu”, escrito por Al Jili c. 1000 dC, e a obra “Coisas suficientes para entender o Cálculo Hindu”, escrita por Al-Nasawi, também em c. 1000 dC.
Segundo os maiores especialistas em história da matemática islamita, Roshdi Rashed e Adel Anbouba, o Triângulo Aritmético teria sido descoberto para obter as soluções no desenvolvimento de potências quadráticas, cúbicas e quárticas de binômios nos tratados de álgebra: o “al Fakhri” e o “al Badi”. (1151 d.C). Na mesma época o islamita, Al-Samaw'al(1125-1180), um Matemático muçulmano e astrônomo de ascendência judaica.Embora Samaw'al tenha nascido de uma família judaica, Ele se converteu ao Islã em 1163 depois de ter tido um sonho, o qual lhe influenciou na decisão de converter-se ao Islã. Seu pai era um Rabino Judeu do Marrocos.
Al-Samaw'al Teve um grande envolvimento com o triângulo. Aos 19 anos escreveu um tratado de álgebra  “al-Bahir fi'l-jabr”, Que significa "O brilhante da álgebra". Ele também desenvolveu o conceito de prova por indução matemática, o qual usou para corrigir e desenvolver o trabalho de Al-Karaji sobre o Triângulo e o Teorema binomial (Teorema de Newton). No seu livro é possível observar-se uma figura do triângulo com 12 linhas, e a demonstração por indução matemática da validade do Teorema Binomial.
Outro grande matemático islamita a envolver-se com o Triângulo Aritmético foi o famoso poeta e matemático persa, Omar Khayyam (1048-1131), nascido na aldeia de Khorasan g.Nishapur, escreveu sobre o triângulo aritmético em alguns de seus trabalhos por volta de 1100. O seu nome completo era Ghiyath al-Din Abu'l-Fath Umar ibn Ibrahim Al-Nisaburi al-Khayyami.
Khayyam mudou-se em 1070 para Samarcanda, no Uzbequistão, que é uma das mais antigas cidades da Ásia Central, onde conseguiu o apoio de Abu Tahir, um proeminente jurista da cidade de Samarcanda, fato este que permitiu-lhe escrever sua obra mais famosa sobre álgebra, o “Tratado sobre a Demonstração de Problemas de Álgebra” (1070), onde ele se refere ao livro que escreveu sobre o Triângulo Aritmético e a sua aplicação na extração aproximada de raízes quadráticas, cúbicas,hoje totalmente perdido.
Um arranjo semelhante dos coeficientes também era conhecido dos árabes na mesma época, e em 1265, o árabe Nasir al-Din al-Tusi (1201-1274) faz uma clara referência ao Triângulo Aritmético em uma de suas obras. Já na Europa, como vimos no início da Parte I (Um triângulo com múltiplas personalidades),mais ou menos um século antes de Blaise Pascal, muitos matemáticos trabalhavam com o Triângulo Aritmético.
Um dos mais famosos foi o matemático alemão Apianus (Petrus Apianus, 1495-1552), que em 1527 publicou um livro cuja capa trazia um desenho do triângulo aritmético. Seu nome foi latinizado para Apianus em virtude da palavra "abelha" (seu nome original continha a palavra alemã Biene, que significa abelha) “apis" em latim.